A Magia de Monserrate - Emma Gilbert
A Magia de Monserrate - Emma Gilbert
Dizem que quem casa não pensa quem pensa não casa. Assim foi comigo.
Apaixonei-me. E não pensei. Meti-me numa aventura que durou mais de quinze anos. Desde o convite do Embaixador Britânico Hugh Arbuthnott, com um inesperado telefonema para a Associated Press convidando-me a liderar a Associação Amigos de Monserrate, foi um casamento que ainda perdura. Foi mais um filho que eu tive.
A Monserrate devo muitas noites sem dormir, muitas horas de alegria, dias de desalento e dias de euforia e de muito, muitíssimo trabalho. Tive contactos com um leque enorme de pessoas que Monserrate e os Amigos de Monserrate me proporcionaram. Fiz novas amizades de grande categoria intelectual, moral e cultural e através destas - aprendi muito: desde história a jardinagem, de política (a mais difícil) a informática, de música a finanças, de arte à organização de eventos, de psicologia a angariação de fundos, de diplomacia a rezar. Obrigada Monserrate.
E não só a Monserrate em geral. Obrigada principalmente ao Fernando Catarino, Gerald Luckhurst e ao João Freitas que tão generosamente partilharam dos seus vastos conhecimentos. Também a algumas pessoas que estão agora connosco em espírito: Joan Croft de Moura, Eduardo Moser, Andrew Bull mas que em vida foram verdadeiros AMIGOS. Bem como um casal, que quis ficar no anonimato, e que nos deu o primeiro patrocínio para limparmos as acácias e salvarmos as mais de 50 árvores que teriam morrido de incúria. A viúva continua a apoiar-nos generosamente. Vêm–se os resultados no roseiral. Confiaram sempre em nós, nos bons e maus momentos, de alma e coração.
O que aprendi é que Monserrate não é apenas o local mágico que tem um genus locci “espírito do local” difícil de descrever. Monserrate são as pessoas que por lá passaram, lá viveram ou trabalharam e deram muito de si sem esperarem qualquer recompensa, mas que tenho a certeza, a receberam de uma forma ou outra e a dobrar. Por mim falo.
Mas falando de trabalhar sem ganhar, quem deu ainda maior exemplo foram os Membros das várias direcções em todos os meus Mandatos e todos sem excepção. Cada um à sua maneira, conforme os seus dons, qualidades e conhecimentos com tarefas de grande visibilidade ou prestígio ou na sombra sem aparente recompensa mas sempre com grande dedicação. Recebiam apenas uma simples sanduíche, um sumo, bastante bonhomie e uma palmadinha nas costas, durante as numerosas e por vezes longas reuniões, variadíssimos eventos e contactos sociais tão essenciais a uma organização como a dos Amigos de Monserrate.
Aí as Mãos à Obra ou “Hands On” eram um exemplo de verdadeiro civismo em actividade. Desde o Edward Robbins que riscou o Land Rover, a menina dos olhos dele, a levar o lixo que ninguém se dignava a apanhar, à minha Mãe que já com um certa idade varria as escadas principais.
Um dia um visitante, aparentemente chocado de ver uma senhora e de respeitável idade a varrer disse: “A Senhora a trabalhar assim e ao Domingo? Aposto ainda que lhe pagam mal”. Ao que minha Mãe, para espanto dele, respondeu sorrindo, “não me pagam nada”.
Grande exemplo foi também dado pelo Presidente da República, Dr. Jorge Sampaio, pois jardinou como qualquer um durante um dia de Mãos à Obra, cortando acácias, plantando fetos e etiquetando árvores. Até, sem saber, arriscou a vida, pois era ajudado por várias entidades, incluindo o Embaixador Britânico, Roger Westbrook, que ao cortar uma acácia reparou que esta iria cair mesmo em cima do Presidente da República. O que lhes valeu foi a presença de espírito do Embaixador gritando “Jorge run” e da rápida reacção do Presidente que de facto correu e não foi apanhado pela árvore. Agora percebem o porquê das noites sem dormir.
Os meus parabéns e agradecimentos vão para o sem número de pessoas que de uma forma ou outra acarinharam e acarinham este projecto. Mas falta uma figura muito importante: Nossa Senhora de Monserrate pois é a ela que sei sem dúvida alguma que devemos NUNCA ter chovido em qualquer dos eventos (quase sempre ao ar livre) que organizámos. Podia chover a potes antes ou depois, mas nunca durante. É um facto incontestável. Em Março de 2007, o ultimo evento organizado durante o meu mandato, tínhamos convidado o Arcebispo do Porto, para fazer uma palestra sobre o Hospital de Todos os Santos (os primeiros donos de Monserrate). Em seguida haveria uma romaria à capela onde cânticos do livro de Vermeille de Montserat nos acolheriam. Chovia a cântaros desde manhã. A Comissão estava desesperada. Até que, às 2 da tarde zanguei-me com Nossa Senhora e disse-lhe que ela tinha de fazer qualquer coisa. Às 3 da tarde, quando o Bispo chegou estava um sol radioso, os Jardins brilhavam, a cascata rugia e o Ardecoro cantava a plenos pulmões. Que mais se pode pedir?
Realmente pedimos e alcançámos: uma entidade responsável e responsabilizável que tomasse conta desta jóia que é Monserrate. Obrigada ao Prof. António Lamas que pegou tão bem no leme dos Parques de Sintra – Monte da Lua.
E agora? Estou na fase dos netos – o gozo pleno de fazer apenas o que me apetece e que gosto. Que maravilha! Tudo vale a pena quando a alma não é pequena.
Sintra, 21 de Março 2010