Poema de João Patricío
Poema de João Patricío
É uma tarde de Estio...
É uma tarde de Estio, é uma tarde de Estio
há vinte e tantos anos já extinta...
Estou sob as japoneiras, vejo o rio
e oiço os gritos dos pavões na quinta...
A minha mãe faz doce na cozinha,
E os meus irmãos (que agora estão com Ela)
sopram (eu oiço-os rir) toda a tardinha
as bolas de sabão, a uma janela...
Nessa penumbra glauca há humidade...
E eu penso que nada, nada existe
tão bom como assim estar, um pouco triste,
numa preguiça em que já há saudade...
Depois vêm-me chamar: é a merenda,
eu beijo as mãos da minha mãe contente;
é sob a acácia do portão que arrenda
o ar da tarde luxuosamente...
Merendamos todos três. Depois, calados,
ficamos ao pé d’Ela a olhar a tarde;
e os olhos do Emílio, extasiados,
beijam-na sempre com um olhar que arde,
olhos de mago em que há tanta doçura
(queria ser em grande marinheiro)
que se podia ver que era o primeiro
que ia, a sorrir, bater à sepultura...
Depois (ainda com tarde) veio a lua,
Mirou-se, toda de âmbar, sobre o rio...
E nada mais...as ralas...á Estio...
calor da terra que respira e sua...
a sombra caminhando pela quinta
aos gritos dos pavões da tarde extinta...